Monday, September 01, 2014

A rã (Três Fábulas Monterrosianas)


Nada irritava tanto a rã mais pequenininha do brejo quanto ser confundida com uma perereca. "É rã!", ela dizia, cerrando os dentes, toda vez que a confundiam. Um domingo de manhã ela estava no brejo vizinho pegando umas moscas pro almoço quando passou por uma família de pererecas sobre uma vitória-régia. "Nossa, que perereca enorme!", exclamou uma delas. A rã estava prestes e xingar e exibir o dedo médio, mas os comentários das outras foram mais rápidos. "Uau, deve ser ótimo ser uma perereca tão grande!!" "Incrível!" "Mãe, mãe, se eu comer bastante mosca eu vou ficar desse tamanho?"
Na segunda, bem cedo, a rã fez as malas e se mudou para o brejo vizinho, onde é tratada com todas as deferências devidas à maior perereca já vista, às quais ela responde com azedume e rispidez, dedicando as piores patadas às pererecas mais pequenininhas.


Antonio Prata é escritor. Publicou livros de contos e crônicas, entre eles 'Meio Intelectual, Meio de Esquerda' (editora 34). Escreve aos domingos.
Retirado de: http://www1.folha.uol.com.br/colunas/antonioprata/2014/08/1505123-tres-fabulas-monterrosianas.shtml

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